quinta-feira, 1 de setembro de 2022

A BÍBLIA, A PROFECIA E A POLÍTICA


 

Os problemas vividos pela sociedade atual assemelham-se aos vividos pelos homens de Deus no Velho e Novo Testamentos. Os profetas, porta vozes de Deus, já viviam às voltas com toda sorte de modalidades de corrupção praticadas na atualidade. Por isso as profecias confrontam o poder corruptor e soam aos nossos ouvidos como discurso político. Isaias no capítulo 5 versículos 18 e 23 e Amós no capítulo 2 versículo 6, por exemplo, vaticinam contra o institucionalismo que favorece a parcialidade, o favoritismo e a impunidade.

Dizer que não é político e fazer, agir, como se político fosse, é a pior forma de se fazer política. A política da não política é a mais hipócrita de todas as políticas, porque se faz política a partir da sua negação. E fazer o que se nega e negar o que se faz é hipocrisia da pior espécie. Além disso, afirmar que determinados atos absolutamente políticos não são políticos, é tergiversar. Isso porque político, sem exceção, todos nós somos, direta ou indiretamente, velada ou abertamente, já que política, por definição original, é o conhecimento, a participação, a defesa e a gestão da polis (cidade-estado na Grécia). Portanto, ser político é algo inerente à condição de ser humano. Além do que, é impossível a existência de uma sociedade sem autoridades, normas, sanções, mecanismos de participação e formas de decisão.

É preciso entender, de uma vez por todas, que o nosso problema com a política está fundamentalmente no fato de que interpretamos mal os textos bíblicos. Por isso tanta aversão. Além do que passamos todo tempo da nossa história ouvindo que política é do diabo. Todo esse modo de pensar acabou por criar um inconsciente coletivo despolitizado do qual estamos conseguindo, com muito custo, nos livrar.

Hoje, se algumas igrejas encontram-se separadas dos temas sociais do mundo que as rodeia, é em razão de uma posição tomada séculos atrás. Na tentativa de se reaproximar de Deus, a Igreja “saiu” do mundo, e para ele fechou as suas portas. A preocupação passou a ser o “interior”, o coração, um tipo legalista de “negar-se a si mesmo para si mesmo”, como expressão de devoção. Com isso a Igreja deixa com os poderosos a articulação política e se dedica, total e irrestritamente, a um tipo de espiritualidade egoísta e antissocial, que só se preocupa com a fé excluindo as obras (Tiago 2. 14-18). Evidentemente, muita coisa precisava ser mudada, na época, mas infelizmente essas mudanças fizeram a Igreja deixar para trás as pegadas de sangue de quem fez do pobre, do miserável e do oprimido, o alvo do seu amor libertador – JESUS CRISTO.

Eu tenho absoluta certeza de que uma ideia que vem se arrastando há séculos, pode ser mudada a médio e a longo prazo. Isto porque este quadro de inércia histórica já começou a ser revertido. A pregação da Igreja, hoje, não visa apenas a alma, mas, sim, o homem inteiro.

Estou de acordo também que a igreja evangélica deste novo milênio tem se tornado uma igreja politizada. Não só acredito como é possível provar isso objetivamente. Explico. A cada ano que passa, o povo latino americano, espoliado nos seus excedentes pelos colonizadores modernos, vai aprendendo - mesmo que seja só no sentido prático da palavra - um pouco mais sobre política: seu alcance, seu poder, sua eficácia, sua abrangência, sua realidade e como fazê-la legitimamente. Além disso, o discurso evangélico está sofrendo sensíveis modificações, sinalizando que é por aí que ocorrerão as transformações necessárias e desejadas.

Hoje, a Igreja Evangélica sabe discernir muito bem em quem ela deve votar. Eu diria mais: a partir desse movimento de conscientização, os evangélicos, que surpreenderam na eleição passada, continuarão a sobressaltar a muitos que viviam da sua carne e do seu sangue.

Daqui para frente, a igreja tem a obrigação, pelas informações recebidas e pelos últimos acontecimentos, de dar uma resposta ética à toda essa estrutura corrupta que se levantou, com base no fisiologismo (relação de poder político em que ações e decisões políticas são tomadas em troca de favores e benefícios privados em detrimento do bem comum). Os evangélicos e os brasileiros, de um modo geral, devem se levantar contra toda essa situação insuportável de apertura econômica e caos social. Por estas e outras razões, eu acredito que, daqui para frente, a despeito de todas as nossas fragilidades, ainda, as coisas serão bem diferentes. Diferentes, porque já está havendo um arrefecimento por parte do povo contra candidatos “quebra galho”, mas sem perfil moral. Prometem aquilo que não podem cumprir e fazem campanhas eminentemente eleitoreiras, imaginando que o povo ainda se encontra na escuridão política, sem saber discernir o certo do errado.

Acredito que um cristão politicamente lúcido precisa ter o gemido da criação nos seus ouvidos a fim de que tenha também vós profética para defendê-la.


Soli Deo Gloria

Pastor Flavio Constantino

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