"Com frequência, tem acontecido que alguns jovens com determinados dons, ao ouvirem um grande pregador, sentem-se cativados por ele e pelo que ele está fazendo. Ficam atraídos por sua personalidade ou por sua eloquência, deixam-se comover por ele e, insconscientemente, começam a sentir o desejo de ser semelhantes a ele e de fazer o que ele está fazendo. Ora, isso pode estar certo, mas pode estar inteiramente errado. Os jovens podem ficar fascinados somente pelo encanto da pregação, atraídos pela ideia de ministrarem a Palavra a audiências e de influenciá-las. Todas as formas de motivos falsos e errôneos podem se instroduzir sorrateiramente. A maneira de nos precavermos desse perigo é perguntar-nos: por que desejo fazer isso? Por que estou preocupado com isso? E, a menos que descubramos um interesse genuíno pelas pessoas, pelo seu estado e condição e tenhamos desejo de ajudá-las, estaremos corretos em duvidar de nossos motivos." (D. Martyn Lloyd-Jones)
O texto acima foi publicado originalmente em 1972, na obra intitulada Preaching and Preachers, traduzida para o português sob o título "Pregação e Pregadores", pela Editora Fiel. Apesar dos trinta e oito anos passados desde a sua primeira publicação, ele se mantém indiscutivelmente atualizado.
Há na atualidade, de formar clara, o risco de muitos jovens desejarem seguir carreira como pregadores, motivados pelos aspectos estéticos da pregação, e pela sensação de poder que ela provoca. Como bem colocou Lloyde-Jones, o interesse genuíno em ajudar as pessoas é que deve ser a razão central, o motivo único deste desejo.
Uma outra questão cabe aqui ser abordada. Muitos pregadores na atualidade, estão influenciando negativamente os mais jovens, pelo fato de que os motivos que o levaram ao ministério da pregação, terem uma relação direta e estarem sob a influência da chamada cultura do narcisismo e da sociedade do espetáculo.
Narciso, de onde se deriva o termo narcisismo, segundo a mitologia grego-romana, era um jovem de incomparável beleza. Ele pensava, em razão disto, ser semelhante a um deus. Como resultado de seus pensamentos, Narciso rejeitou a afeição de Eco, uma bela jovem até que esta, desesperada, definhou, deixando apenas um sussurro débil e melancólico. Para dar uma lição ao rapaz frívolo, a deusa Némesis condenou Narciso a apaixonar-se pelo seu próprio reflexo na lagoa de Eco. Encantado pela sua própria beleza, Narciso deitou-se no banco do rio e definhou, olhando-se na água e se embelezando. Outras versões dizem que enquanto caminhava pelos jardins de Eco, ele descobriu a lagoa de Eco e viu o seu reflexo na água. Apaixonando-se profundamente por si próprio, inclinou-se cada vez mais para o seu reflexo na água, acabando por cair na lagoa e se afogar.
A conceito de cultura do narcisismo, pode ser compreendido através da breve exposição sobre o tema, feita pela Dra. Ana Almeida em seu blog:
"A sociedade actual estimula a cultura do narcisismo. Cada vez mais competimos de forma acirrada por um “lugar ao sol” num mundo em que impera a lei do mais capaz e do sucesso ou da aparência dele. As exigências de sucesso provocam um enorme desgaste. As pessoas sentem-se obrigadas a atingir metas idealizadas e a ultrapassarem a qualquer custo as suas limitações. Instala-se um conflito entre o “eu idealizado” e o “eu real” que nos leva a desenvolvermos a crença de que valemos mais pelo que temos ou aparentamos ser do que pelo que realmente somos. A ânsia de reconhecimento faz com que a aparência tenha um enorme valor; quando somos confrontados com a diferença entre aquilo que pretendemos ser e aquilo que somos verdadeiramente a nossa auto-estima sofre, e esta diminuição da auto-estima torna-nos vulneráveis à depressão."
Sobre a sociedade do espetáculo, e comentando a obra A Sociedade do Espetáculo, de Guy Debord, José Arbex Jr. escreveu no livro Showrnalismo: a notícia como espetáculo (Editora Casa Amarela, São Paulo, 2001):
"O espetáculo – diz Debord – consiste na multiplicação de ícones e imagens, principalmente através dos meios de comunicação de massa, mas também dos rituais políticos, religiosos e hábitos de consumo, de tudo aquilo que falta à vida real do homem comum: celebridades, atores, políticos, personalidades, gurus, mensagens publicitárias – tudo transmite uma sensação de permanente aventura, felicidade, grandiosidade e ousadia. O espetáculo é a aparência que confere integridade e sentido a uma sociedade esfacelada e dividida"
Como bem coloca Joel Birman no livro Mal-estar na atualidade: A psicanálise e as novas formas de subjetividade, a cultura do narcisismo e a sociedade do espetáculo enfatizam a exterioridade e o autocentramento. Dessa forma, em se tratando de pregação e pregadores, o motivo e o desejo ficam comprometidos, visto que as necessidades do outro deixam de ser relevantes e de terem primazia, na mesma proporção em que as necessidades do próprio sujeito, norteadas pelo pensamento, sentimento e desejo narcísico, mediante o exibicionismo espetacular, ganham exclusividade.
O outro se torna objeto de mero usufruto do sujeito narcísico, lhe servindo apenas como instrumento para o incremento da auto-imagem, mediante a manipulação através dos meios de comunicação de massa, e de uma forte ênfase na estetização da pregação, em detrimento do legítimo, salutar e bíblico propósito da pregação, e da verdadeira e bíblica razão de ser e fazer do pregador.
Apesar do triste e atual quadro, percebo mudanças no cenário evangélico nacional, onde vislumbro a restauração da verdadeira pregação bíblica, realizada por pregadores santos e vocacionados por Deus para esta privilegiada missão, movidos pelos mais nobres e excelentes motivos, e desejosos de proporcionar o bem maior ao seu próximo, ou seja, a sua salvação, libertação, restauração, transformação, edificação, consolação e exortação, tendo como base e fundamento a Bíblia Sagrada.
Autor: Pastor Altair Germano
Fonte: http://www.altairgermano.net/
Nobre companheiro,
ResponderExcluira publicação deste post num blog de um psicanalista é para mim muito honroso.
Conto com as vossas orações.
Abraços,
Uau! Tudo isso nos remete a responsabilidades nada superficiais com veracidade de nosso chamado. Se eu não puder dizer com convicção o que o apóstolo das gentes disse, não deveria dar nem um só passo em direção ao púlpito. "Mas, quando aprouve a Deus, que desde o ventre de minha mãe me separou, e me chamou pela sua graça, revelar seu Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios, não consultei carne e sangue..." (Gl 1:15-16 AA). Já estou seguindo o seu blog para nele achar pepitas como essa. Paz em Cristo.
ResponderExcluirQuerido Pastor Altair Germano,
ResponderExcluirA Paz do Senhor,
Mais honroso é pra mim, ter a sua permissão pela publicação desse excelente artigo aqui em meu blog como também pela sua digníssima visita por aqui.
Um grande abraço,
No Amor de Cristo,
Pastor Flavio Constantino.
Querido Pastor Al Felix,
ResponderExcluirA Paz do Senhor,
O seu comentário enriqueceu o texto.
Volte sempre,
Um grande abraço,
No Amor de Cristo,
Pastor Flavio Constantino.